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Sonda da Nasa vai tentar capturar pedaço de asteroide e trazê-lo de volta à Terra

Se for bem-sucedida, a missão OSIRIS-REx vai bater recorde de coleta de material de corpo celeste não-lunar

Renderização de artista da espaçonave OSIRIS-REx da NASA se preparando para tocar a superfície do asteróide Bennu. Créditos: NASA, Goddard e Universidade do Arizona

Um assalto interplanetário está em andamento do lado de lá do Sol. Amanhã, a sonda espacial OSIRIS-REx, da Nasa, vai tentar capturar  amostras da superfície de um asteroide. No processo, ela terá que se desviar de pedregulhos gigantes e enfrentar outros perigos. Se tudo der certo, ela depois iniciará uma longa jornada de volta para casa, e entrará para a história como a missão que trouxe para a Terra a maior quantidade de material não lunar. Sua carga preciosa, feita de rochas de outros mundos,  talvez traga as respostas para antigas questões sobre nossas origens cósmicas. “Nós esperamos conseguir material que nos informe sobre a primeira fase da formação de nosso sistema solar”, diz Patrick Michel, do Observatório Côte d’Azur, na França. 

Com custo estimado em aproximadamente US$ 1 bilhão, a missão OSIRIS-REx foi lançada em 2016  em direção ao asteroide Bennu, que segue uma órbita um pouco maior que a da Terra. Equipado com um instrumento parecido com um braço estendido chamando Touch-and-Go Sample Acquisition Mechanism (TAGSAM), o objetivo principal  da nave é tocar  a superfície do Bennu e obter  uma amostra considerável, de até dois quilogramas, antes de voltar à Terra. A única missão de retorno de  amostras coletadas em asteroides bem-sucedida até hoje, a Hayabusa, do Japão, trouxe somente alguns microgramas em 2010. Sua sucessora, a Hayabusa 2, vai fazer uma  nova coleta de amostras em dezembro, mas o limite de material coletado será de uma grama. 

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O desenvolvimento da OSIRIS-REx levou por aproximadamente dois anos, diz Dante Lauretta, cientista planetário na Universidade de Arizona que é o investigador-chefe da missão. “Eu trabalhei nisso por mais de 16 anos”, ele diz. E agora o momento de reconhecimento chegou. Nesta terça-feira, dia 20 de outubro, às 14:50 no horário oficial de Brasília, os controladores da missão irão dar o comando para que a nave inicie uma abordagem autônoma de Bennu, a partir de sua órbita estacionária, cerca de 700 metros acima da superfície. Ao longo das próximas quatro horas e meia, a sonda lentamente irá descer até um ponto pré-selecionado chamando Nightingale. Então, às 19:10 no horário de Brasília, a nave deve tocar a superfície por não mais do que 15 segundos, e aspirar uma amostra antes de iniciar o retorno. 

A OSIRIS-REx e o Bennu estão atualmente do outro lado do Sol, a cerca de 334 milhões de quilômetros da Terra. Isso significa que o processo de comunicação com a nave demora 18 minutos, o que explica a necessidade de que o pouso seja feito de forma autônoma. Mas a equipe da missão está bem preparada: em agosto, foi realizado o segundo de dois ensaios de pouso, nos quais a espaçonave chegou a apenas 40 metros de distância do local de pouso, antes de voltar à órbita. Esse ensaio incluiu um teste da capacidade  da espaçonave de utilizar imagens visuais para chegar à superfície. 

Originalmente, os cientistas haviam planejado utilizar rastreamento por laser para realizar o pouso no Bennu. Mas, conforme o tempo progrediu, eles descobriram que se tratava de  um asteroide da categoria “pilha de escombros”, o que significa que ele é composto de muitas rochas de diferentes tamanhos. Essas características  dificultam o pouso via laser, devido ao modo como a luz é refletida na superfície do asteroide. Por isso, a equipe decidiu empregar as câmeras da espaçonave para guiar o pouso em Nightingale, uma região relativamente plana entre os destroços, com 16 metros de extensão.  “Nós basicamente estamos tentando estacionar uma van grande em uma vaga que tem o espaço de duas vagas”, diz Lauretta. 

Entender a estrutura e a composição do Bennu são um dos objetivos essenciais da OSIRIS-REx desde a sua chegada. Na semana passada, uma série de pesquisas publicadas nas revistas Science e Sciences Advances detalharam novas descobertas sobre o asteróide feitas a partir de dados coletados pela nave. Em um dos estudos, os cientistas descreveram a presença de material orgânico de carbono na superfície de Bennu. “Carbono orgânico é interessante, pois acreditamos que asteroides como o Bennu poderiam ter transportado matéria orgânica para a Terra primitiva”, diz Hannah Kaplan, do Goddard Space Flight Center da NASA, que é autora principal de um dos estudos recentes, e co-autora de outro. “Então, conseguir observar que aspecto tinha a matéria orgânica ancestral é algo muito empolgante.” 

Em outra pesquisa, os cientistas conseguiram utilizar imagens captadas pela OSIRIS-REx de materiais ejetados da superfície de Bennu para entenderem sua composição interior e gravidade. Após a espaçonave chegar no asteroide, em 2018, os cientistas ficaram surpresos em descobrir que o Bennu estava ativamente ejetando partículas no espaço, e que permaneceram em órbita ao redor dele. “Nós usamos esse “campo de gravidade de partículas” para analisar como a massa é distribuída dentro de Bennu”, diz Daniel Scheeres da Universidade de Colorado em Boulder, que foi o autor principal do estudo. Os pesquisadores descobriram que o interior do asteroide era heterogêneo, o que significa que algumas partes eram mais densas que as outras, o que poderia explicar seu estranho formato convexo. Puxado pela rotação do asteroide, “o material cai sobre a região equatorial, embora de forma relativamente lenta”, diz Scheeres. 

A natureza de “pilha de escombros” do Bennu adiciona dificuldades  ao pouso da OSIRIS-REx. A primeira aparecerá cerca de quatro horas depois que a sonda deixar sua órbita estacionária, quando a espaçonave começará sua “combustão do ponto de verificação”: ela utilizará seus propulsores para se colocar momentaneamente, a 125 metros acima de Nightingale antes de começar a descer. Cerca de 11 minutos depois, a OSIRIS-REx irá lentamente  descer para a superfície, desacelerando sua velocidade até chegar a apenas 10 centímetros por segundo, e o  braço TAGSAM se expandirá em direção ao asteroide.   

Quando o braço tocar a superfície, a velocidade relativa da sonda cairá a zero. A cabeça de formato circular do braço coletor irá permanecer em contato com o Bennu por até 15 segundos, bombeando gás nitrogênio para a superfície de forma a fazer com que o material do asteroide se eleve e possa ser coletado.  A OSIRIS-REx então irá se elevar e seus seus propulsores serão acionados para trazê-la de volta a sua órbita estacionária acima da superfície do asteróide. Devido às restrições estabelecidas pela  COVID-19, a maior parte  da equipe da OSIRIS-REx irá observar a ação a partir de suas casas, exceto por uma dezena de pessoas que estarão no controle da missão. 

O procedimento não será sem emoção. Primeiro, a espaçonave deve se certificar que não existem rochas perigosas na superfície antes de começar o pouso. Ele irá tomar a decisão de pousar ou não de forma autônoma. A equipe também espera que o braço TAGSAM não esbarre em  nenhuma rocha que esteja situada de maneira inconveniente na superfície, o que iria prejudicar toda a inclinação da espaçonave. O maior perigo nesse cenário é um pedregulho próximo massivo, apelidado de “Monte da destruição”, que pode se revelar fatal  caso a OSIRIS-REx se choque com ele durante sua subida. “O pior cenário é: a sonda  se aproxima do Monte da destruição , se inclina em direção a ele e aciona seus propulsores, e bate nessa rocha”, diz Lauretta. 

Se tudo ocorrer como planejado, a equipe espera coletar algo entre 60 gramas a dois quilogramas de material. Ao rotacionarem a espaçonave com o braço estendido, os pesquisadores vão conseguir medir a inércia da amostra e estimar o quanto de material foi coletado com precisão de mais ou menos 20 gramas. Se se considerar que foi obtido o suficiente, 60 gramas ou mais, a nave irá guardar a cabeça do coletor dentro de um contêiner projetado para conduzir  a amostra de forma segura pela atmosfera da Terra. Se nenhuma amostra for coletada, a espaçonave possui gás de nitrogênio o suficiente a bordo para tentar realizar até dois novos pousos, em dezembro ou janeiro. Caso o ponto  Nightingale seja muito afetado  pelos propulsores da nave, esses outros pousos irão ocorrer em um segundo local chamando Osprey. 

Mas, se se considerar que foram coletadas amostras em quantidade suficiente em  Nightingale — algo que a equipe irá decidir no dia 30 de outubro — a sonda  permanecerá em órbita até março de 2021, quando irá deixar  Bennu e iniciar a volta para casa. Em setembro de 2023, ele irá voltar ao nosso planeta e liberar a cápsula em nossa atmosfera. A cápsula então irá acionar o paraquedas até pousar de forma segura, no deserto de Utah. Porém há outro problema para resolver.  “A maior decepção é que a equipe não poderá se reunir para celebrar esse evento”, diz Lauretta, que está agora esperando pelo retorno em 2023 da espaçonave para a Terra, para alguma revelação. “É melhor que a pandemia tenha acabado até lá”. 

Jonathan O’Callaghan

Publicado em 19/10/2020 

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