Sinal misterioso vindo de Próxima Centauri intriga cientistas
Notícias publicadas dia 18 no jornal britânico The Guardian relatam a detecção de um sinal misterioso vindo da estrela mais próxima de nós, a Proxima Centauri. A Proxima Centauri é escura demais para ser vista da Terra a olho nu, ainda que fique bem perto de nós em termos cósmicos, a 4,2 anos-luz de distância. O sinal, que foi encontrado há alguns meses em dados coletados ao longo do último ano, parece ter sido emitido de nossa estrela vizinha, e não pode ser atribuído a alguma interferência oriunda da Terra. Isso levanta uma possibilidade, muito pequena, de que a transmissão seja o produto de alguma inteligência extraterrestre avançada (IEA), o que se chama de “tecno-assinatura”. Agora, em depoimento para a Scientific American, os autores da descoberta alertam que ainda há muito trabalho para ser feito, mas admitem que há razões para o interesse. “Ele possui algumas propriedades particulares que passaram por muitas de nossas verificações, e não podemos explicar”, diz Andrew Siemion, pesquisador da Universidade da Califórnia em Berkeley.
Curiosamente, o sinal ocupa uma banda estreita do espectro de rádio: 982 megahertz, especificamente, que é uma região em geral posta de lado tipicamente não usada nas transmissões por satélite. “Não conhecemos nenhuma explicação natural para comprimir a energia eletromagnética numa frequência” como essa, diz Siemion. Talvez, ele diz, alguma fenômeno ainda desconhecido da física de plasma possa oferecer uma explicação natural para essas ondas de rádio tão concentradas. Mas, “até o momento, a única explicação que conhecemos para esse fenômeno é tecnológica”.
++ LEIA MAIS
Centro americano pode ser o primeiro programa acadêmico de pesquisa em busca de vida alienígena
Protótipo de Espaçonave da SpaceX voa bem em teste épico e explode ao pousar
A detecção foi feita por um projeto de 100 milhões de dólares chamado Breakthrough Listen, liderado por Siemion e financiado pelo bilionário de tecnologia Yuri Milner, sobre a tutela do projeto Breakthrough Initiatives de Milner. O objetivo desse empreendimento, previsto para durar anos (que começou em 2015, com uma inauguração que reuniu astros como Stephen Hawking e outros ilustres da ciência espacial) é adquirir tempo de observação em rádiotelescópios ao redor do mundo para buscar nos céus por sinais de civilizações tecnológicas. Essa busca, claro, é conhecida comumente como Busca por Inteligência Extraterrestre (SETI, na abreviação em inglês). Até hoje, apesar de mais de meio século de buscas do SETI, nenhuma evidência conclusiva foi encontrada, e quase todos os possíveis sinais foram atribuídos a satélites em órbita da Terra e a outras interferências causadas por humanos.
“Se você detecta um sinal que não vem da superfície da Terra, você sabe que detectou tecnologia extraterrestre”, diz Jason Wright, astrônomo da SETI na Universidade de Penn State na Pensilvânia. “Infelizmente, os humanos lançaram muita tecnologia extraterrestre”.
A história dessa nova detecção do SETI começou na verdade no dia 29 de abril de 2019, quando cientistas afiliados com a Breakthrough Listen começaram a coletar dados que iriam então revelar esse sinal intrigante. Uma equipe utilizou o rádiotelescópio de Parkes, na Austrália, para buscar por sinais de explosões solares geradas pela estrela anã vermelha Proxima Centauri. Em parte, o objetivo era entender como tais explosões podem afetar os planetas de Proxima. O sistema possui pelo menos dois planetas. O primeiro, apelidado de Proxima b, descoberto em 2016, tem cerca de 1,2 o tamanho da Terra e uma órbita de 11 dias. Proxima b fica na “zona habitável” da estrela, uma região onde é possível que exista água líquida na superfície de um planeta rochoso, desde que as intensas explosões solares de Proxima Centauri não prejudiquem a atmosfera do planeta. Outro planeta, Proxima c, com massa aproximada de 7 Terras, foi descoberto em 2019 em uma órbita gelada de 5,2 anos.
Usando o rádiotelescópio Parkes, os astrônomos observaram a estrela por 26 horas como parte de um estudo de explosões solares. Mas, como é rotina dentro do projeto Breakthrough Listen, eles também encaminharam os dados obtidos para análises posteriores pelo SETI em busca de candidatos a sinais. A tarefa coube a um jovem estagiário no programa SETI de Siemion em Berkeley, Shane Smith, que também é estudante de pós-graduação no Hillsdale College, em Michigan. Smith começou a vasculhar os dados em junho deste ano, mas só no final de outubro ele se deparou com a curiosa emissão de banda estreita a 982,002 megahertz que constava das observações de Proxima Centauri. A partir daí, as coisas aconteceram rápido. “É o sinal mais empolgante que já encontramos no projeto Breakthrough Listen, porque não tivemos um salto de sinal anteriormente”, diz Sofia Sheikh, da Penn State University, que dirigiu a análise posterior do sinal para o Breakthrough Listen, e é o autor principal de um artigo que detalha esse trabalho, que será publicado no início de 2021. Logo, a equipe começou a chamar o sinal por um nome mais formal: BLC1, para “Breakthrough Listen Candidate 1”.
Para atrair o interesse dos pesquisadores do SETI, um sinal primeiro deve passar por uma série de simples testes automáticos para descartar a possibilidade de que seja uma interferência óbvia da Terra. Porém, rotineiramente centenas de candidatos passam dessa fase e são encaminhados para futuras investigações. Então, quase todos são descartados como sendo alguma miragem ou erro que enganou o algoritmo inicial— talvez excesso de estática, por exemplo — e deixam de ser considerados como tentativas de transmissão por alienígenas. “Esse é a exceção”, diz Sheikh.
Ao revisitar os dados de 2019, Sheikh e seus colegas notaram que os telescópios olharam para a Proxima diversas vezes em varreduras que duravam 30 minutos ao longo de uma semana. A Breakthrough Listen utiliza uma técnica chamada “nodding”, onde o telescópio irá passar um período de tempo buscando por um alvo e então um período equivalente olhando em outros locais no céu, para checar por sinais potenciais que estejam realmente vindo do alvo, e não, digamos, de um microondas na cafeteria do observatório. “Em cinco das observações de 30 minutos, ao longo de cerca de três horas, observamos essa sinal se repetindo”, diz Sheikh, um sinal de que o sinal realmente se originou de Proxima Centauri ou de alguma outra fonte espacial que fica nesta parte do céu.
Alguém poderia dizer que o caso foi solucionado. Mas ainda que uma origem por uma fonte cósmica natural possa parecer improvável, não pode ser descartada. E ainda que uma explicação natural possa parecer improvável, uma explicação “não natural”, que envolve alienígenas, é ainda menos provável. Consequentemente, os membros da equipe da Breaktrhough Listen entrevistados para esse artigo insistem firmemente que a chance de que outra explicação para o sinal, além de interferência terrestre, é extremamente remota. “A coisa mais provável é que sua origem seja alguma atividade humana”, diz Pete Worden, diretor executivo da Breakthrough Initiatives. “E quando digo mais provável, é cerca de 99,99%”.
O ceticismo racional se extende até o topo. “Quando lançamos o Breakthrough Listen com Stephen Hawking em 2015” disse Milner, “entendia-se que seria usada a abordagem científica mais rigorosa para analisar todos os sinais candidatos”. Milner, e aparentemente todos os pesquisadores do SETI apoiados por sua fundação, esperam que o BLC1 seja desmascarado e descartado pelo minucioso trabalho de pesquisa do projeto. Mas, talvez ele não seja.
Por enquanto, estão previstos meses de novas análises para que se possa descartar em definitivo outras fontes potenciais. E o BLC1, embora pareça ser proveniente de Proxima Centauri, não se encaixa no que se esperaria de uma tecno-assinatura vinda desse sistema. Primeiro, o sinal não emite nenhum traço de modulação — que são variações em suas propriedades que podem ser utilizadas para transmitir informação. “Para todos os fins, o BLC1 é apenas um tom, apenas uma nota”, diz Siemion. “Não possui nenhuma característica adicional que possamos discernir nesse momento”. Segundo, o sinal “desliza”, o que significa que parece variar um pouco de frequência, um efeito que pode se dever ao movimento de nosso planeta, ou ao movimento de uma fonte extraterrestre, como um transmissor situado na superfície de um dos planetas do Proxima Centauri. Porém, o movimento é o contrário do que seria de se esperar de um sinal que se originasse de um mundo que orbita a estrela mais próxima do nosso Sol. “Nós esperaríamos que a frequência do sinal caísse, como um trombone”, diz Sheikh. “Ao invés disso, o que vemos é como um apito: a frequência sobe.”
Até o momento, observações posteriores fracassaram em identificar o sinal novamente. Observações repetida são algo essencial para confirmar que o BLC1 seria uma tecno-assinatura genuína. “Se for gerado por uma ETI, deve ser algo que se repete porque é pouco provável que seja algo que ocorre só uma vez”, diz Shami Chatterjee, um astrônomo de rádio da Universidade de Cornell em Nova York. “Se uma equipe independente em um observatório independente puder recuperar o mesmo sinal, então sim. Eu apostaria dinheiro que não vão conseguir, mas eu amaria estar errado”.
De qualquer maneira, este se mantém como um dos sinais mais intrigantes já encontrados pelo Breakthrough Listen até hoje. Sheikh os comparou ao chamado sinal ” uau!”, detectado em 1977, e que alguns acreditaram ser de origem extraterrestre. “Eu acredito que é parecido com o “sinal ” uau!” ela diz. Porém, o mais provável é que sua origem seja simplesmente alguma fonte de interferência localizada na Terra, e que ainda é ignorada. Em alguns meses, provavelmente teremos certeza de uma coisa ou outra. Mas até o momento, não são alienígenas, certo?
Jonathan O’Callaghan
Lee Billings
Publicado em 21/12/2020