Nuvens de ferro, chuvas de titânio, ventos poderosos: revelado clima de exoplaneta “Júpiter quente”
Cientistas realizam as melhores observações até o momento do lado noite de exoplaneta gigante gasoso do tipo “Júpiter quente” e estudam seus fenômenos climáticos: nuvens de ferro e do mineral corindo, chuvas de titânio, um ciclo da água destrutivo e ventos que assolam sua atmosfera a mais de 5 quilômetros por segundo.
Descoberto em 2015, e nomeado de “WASP-121b”, o exoplaneta possui aproximadamente o dobro do tamanho de Júpiter, e orbita muito próximo a sua estrela hospedeira, localizada a 850 anos-luz da Terra. Dessa forma, essa proximidade lhe concede algumas características especiais: um período de órbita de cerca de 30 horas — um dos mais curtos já observados — e uma “rotação sincronizada” com sua estrela. Isso significa que um de seus lados (“lado dia” ou “lado quente”) sempre estará voltado para ela, enquanto o outro estará permanentemente apontado para o espaço (“lado noite” ou “lado frio”).
Uma equipe de pesquisadores do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT, na sigla em inglês; EUA), que já havia pesquisado o “Júpiter quente” antes, utilizou técnicas de espectroscopia para mapear a mudança de temperatura entre os dois lados do planeta e a composição da atmosfera, de acordo com sua altitude. O artigo resultante, o primeiro a estudar o lado noite de um exoplaneta, foi publicado na Nature Astronomy.
“Agora estamos deixando de tirar fotos isoladas de regiões específicas da atmosfera de exoplanetas para estudá-los como os sistemas 3D que realmente são”, afirma Thomas Mikal-Evans. Ele é líder do estudo e pós-doutor no Instituto Kavli para Astrofísica e Pesquisa Espacial do MIT.
Espectroscopia de exoplaneta
No trabalho, os pesquisadores utilizaram duas observações da luz do exoplaneta enquanto percorria duas órbitas, feitas em 2018 e 2019 pelo Telescópio Espacial Hubble. Ao decompor a luz das observações nos comprimentos de onda que a compunham — e analisar suas intensidades específicas — a espectroscopia pode inferir as características de seus materiais.
Mas, no caso do lado noite, isso se torna mais difícil. É preciso detectar as sutis alterações na “composição” luminosa desse espectro, enquanto o planeta percorre sua órbita.
“Planetas do tipo Júpiter quente são famosos por ter lados dia muito brilhantes, mas o lado noite é outra história. Para o WASP-121b, o lado noite é 10 vezes mais opaco que seu lado dia”, afirma Tansu Daylan, coautor do estudo. Ele é pós-doutor pelo MIT e faz parte da missão TESS, da NASA.
Uma previsão do tempo diferente
Apesar deste fator complicador, a equipe analisou o ciclo da água do planeta. Enquanto na Terra ele envolve evaporação da água líquida, formação de nuvens e precipitação em chuva, em WASP-121b o ciclo pode ser muito mais destrutivo.
No lado dia, as temperaturas de até 3.000 kelvin (2.727°C) destroem as ligações moleculares da água, separando-a em átomos que são carregados por seu clima explosivo até o lado noite, onde esfriam e voltam a unir-se em H2O. Em seguida, a água gasosa é levada de volta para o lado chamuscado pelo calor da estrela, recomeçando o ciclo.
Os ventos tempestuosos que carregam os átomos entre sua destruição e reformação e não carregam apenas água: nuvens metálicas de ferro e titânio líquido podem se formar no lado noite, junto do mineral corindo — o mesmo que compõe safiras e rubis. Quando essas nuvens são arrastadas até o lado dia, as substâncias são vaporizadas e, quando voltam a condensar no lado noite, podem formar precipitações exóticas — talvez até chuvas de pedras preciosas líquidas das nuvens de corindo.
“Com essa observação, realmente estamos obtendo uma visão global da meteorologia de um exoplaneta”, afirma Mikal-Evans.
Temperaturas e turbulências
Ao rastrear a presença de vapor de água em vários níveis do exoplaneta, os pesquisadores puderam também avaliar as diferenças de temperatura de acordo com a altitude.
“Nós vimos essa presença de água e mapeamos como mudava em diferentes partes da órbita do planeta”, explica Mikal-Evans. “O processo guarda informações de como está a temperatura do planeta em função de sua altitude”.
O grupo concluiu que as temperaturas no lado dia variavam entre 2.500 K (2227°C), nas camadas mais profundas que puderam observar, e 3.500 K na superfície gasosa. Porém, no lado noite, a tendência era oposta: 1.800 K na camada mais profunda, e 1.500 K na superfície — um fenômeno chamado de “inversão térmica”.
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Nos mapas de temperatura, também foi possível identificar que o ponto mais quente do exoplaneta não era logo na frente da estrela (ponto sub estelar) — onde é diretamente atingido por seu calor — mas sim quilômetros a leste.
Segundo Mikal-Evans, a explicação seria que ventos intensos empurram o material aquecido nessa direção. “O gás é aquecido no ponto sub estelar, mas é ‘asoprado’ para o leste anter que possa irradiar [calor] ao espaço”, explica ele.
Assim, com base nesse deslocamento, os pesquisadores calcularam que os ventos podem chegar a 5 quilômetros por segundo. Segundo Daylan, “esses ventos são muito mais velozes que as correntes de jato da Terra. E eles podem mover nuvens por todo planeta em cerca de 20 horas”.
Novo telescópio, novas observações
Para continuar seus estudos, os pesquisadores já reservaram tempo de observação no Telescópio Espacial James Webb, lançado no Natal de 2021. Além de expandir seu mapeamento do vapor de água, o grupo espera rastrear os movimentos de monóxido de carbono — um provável componente dessa tumultuada atmosfera.
“Seria a primeira vez que poderíamos medir uma molécula carregadora de carbono na atmosfera desse planeta”, afirma Mikal-Evans, pensando em possíveis estudos de formação do tipo planetário de WASP-121b. “A quantidade de carbono e oxigênio na atmosfera provém indícios da origem de planetas desse tipo”.
Publicado em 22/02/2022.