Software identifica mais de 300 novos exoplanetas
Uma equipe de astrônomos utilizou um novo software de identificação de planetas para analisar o banco de dados da missão K2 Telescópio Espacial Kepler, da NASA. O programa facilitou o processo de descoberta e encontrou 366 novos exoplanetas, incluindo um sistema planetário pouco usual, com dois gigantes gasosos orbitando muito próximos um do outro.
A descoberta de planetas fora de nosso Sistema Solar, ou exoplanetas, é algo relativamente recente no mundo da astronomia, começando apenas em 1995. Até hoje, cerca de 5.000 foram confirmados, o que, por sua vez, demonstra o impacto da identificação de quase quatro centenas de uma só vez.
Segundo os autores do artigo, publicado no The Astronomical Journal, “descobrir centenas de exoplanetas é uma conquista significativa por si só. Mas o que eleva este trabalho é a maneira como ele vai esclarecer as características da população de exoplanetas como um todo,” afirmou Erik Petigura. Ele é professor de astronomia da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA, na sigla em inglês, EUA) e coautor do trabalho.
A jornada do Telescópio Espacial Kepler
Apesar da descoberta ser recente, os dados utilizados foram coletados ao longo dos nove anos e meio da missão K2 do Telescópio Espacial Kepler. Desde seu lançamento, o objetivo deste telescópio foi procurar por exoplanetas — K2 é sua segunda missão com este objetivo. A primeira teve um fim abrupto devido a uma falha mecânica de reparo impossível. Ela danificou seus giroscópios, tornando-o incapaz de continuar observando o cantinho de céu para o qual foi projetado.
Então, em 2013, a NASA recorreu à comunidade científica, buscando ideias para uma nova missão para o telescópio que, mesmo com seu giroscópio defeituoso, ainda poderia ser utilizado. Desta consulta surgiu a missão K2, que durou até o ano de 2018, quando o Kepler foi aposentado definitivamente — mas não antes de coletar um enorme banco de dados, com imagens de mais de 800 milhões de estrelas em cerca de 500 terabytes.
Como o telescópio não foi projetado para esta segunda missão, seu software original não estava preparado para processar as informações que coletava, especialmente quanto ao tamanho dos planetas e a distância até suas estrelas. Portanto, antes de realizar o presente estudo, parte da equipe do projeto Scaling K2, que trabalhou neste artigo, elaborarou programas para automatizar o processamento destes dados, tornando-os utilizáveis para futuras pesquisas.
O software
Apesar deste banco de dados já conter todas as informações utilizadas no estudo, a identificação dos exoplanetas no meio de todo este material só foi possível devido ao software empregado. Ele foi desenvolvido por Jon Zink, estudante de pós-doutorado da UCLA e principal autor do estudo.
Detectar a presença de um exoplaneta pode ser difícil — eles são pequenos e opacos diante das estrelas. Para contornar essa dificuldade, o método mais usado é observar a ocultação na luz de uma estrela enquanto o objeto estudado passar na sua frente — se a sua luz emitida diminuir, algo a bloqueou.
Entretanto, a ocultação por si só não comprova a existência de um exoplaneta. Outros fenômenos astrofísicos podem provocar leituras similares, sem contar com o ruído presente nos instrumentos. Muitas vezes se torna claro que não havia nada por lá. Por isso, é necessário comprovar cada suspeito, muitas vezes recorrendo à observação direta para ter certeza de sua presença. Isso torna o processo de detecção lento e burocrático.
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É nesse último passo que o software desenvolvido por Zink age. Ele separa as observações de planetas reais dos falsos positivos, diminuindo em muito o trabalho de comprovação posterior. “O algoritmo de detecção e catalogação de planetas que Jon e a equipe Scaling K2 desenvolveram é um grande avanço para entender a população planetária,” disse Petigura. “Eu não tenho dúvidas que eles irão aperfeiçoar nosso entendimento dos processos físicos pelos quais planetas se formam e evoluem.”
Eles utilizaram as instalações da UCLA para processar o enorme banco de dados através do algoritmo, resultando na identificação de 747 exoplanetas. Mais da metade, 388, já haviam sido identificados pelos métodos tradicionais, mas 366 são inéditos e serão incorporados no catálogo de exoplanetas da NASA.
Segundo Zink, a descoberta ajuda a entender quais tipos de estrelas têm mais chances de abrigar planetas, além das condições e materiais necessários para sua formação — nosso Sistema Solar pode ser bastante diferente do sistema planetário comum. “Nós precisamos olhar para uma grande variedade de estrelas, não somente aquelas que nem nosso Sol, para entender isso,” explicou ele.
Dois gigantes gasosos pouco usuais
Um dos sistemas planetários mais intrigantes descobertos na análise foram dois gigantes gasosos orbitando muito próximos um do outro. Além disso, os planetas, com o tamanho próximo de Saturno, estavam a uma distância inusualmente pequena de sua estrela.
A equipe não sabe quais são as causas dessas idiossincrasias. Ainda assim, Zink afirma que descobrir sistemas muito diferentes das expectativas ajuda na elaboração de ideias cada vez mais precisas. “A descoberta de cada novo mundo provém um vislumbre único nos processos físicos que desempenham um papel na formação planetária,” afirma ele.
Publicado em 30/11/2021.