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Novo computador quântico baseado em luz supera supercomputadores mais poderosos

Experimento que combina lasers e espelhos "resolveu" um problema que é complicado demais para ser elucidado por qualquer computador tradicional.

Shutterstock

Pela primeira vez, um computador quântico que utiliza fótons – as partículas da luz – conseguiu apresentar um desempenho superior até mesmo ao dos mais rápidos supercomputadores clássicos.

Uma equipe de físicos liderada por Chao-Yang Lu e Jian-Wei Pan, da Universidade de Ciência e Tecnologia da China (USTC), em Xangai, empregaram em seu computador quântico, chamado Jiŭzhāng,  uma técnica chamada amostragem Gaussiana de bósons. O resultado, relatado na revista Science, foi a detecção de 76 fótons, um total  muito superior ao recorde  anterior de detecção de cinco fótons, e das capacidades dos supercomputadores clássicos. Ao contrário de um computador tradicional que utiliza  processadores de silício, o Jiŭzhāng é uma elaborado arranjo experimental de bancada  feito de  lasers, espelhos, prismas e detectores de fótons. Não é um computador que um dia poderá enviar e-mails ou armazenar arquivos, mas demonstra o potencial da computação quântica.

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No ano passado, o Google ganhou as manchetes quando seu computador quântico Sycamore levou cerca de três minutos para fazer o que levaria um supercomputador três dias (ou 10 mil anos, dependendo do método de estimativa empregado). Em seu artigo, a equipe do USTC estima que o terceiro supercomputador mais poderoso do mundo,  o Sunway TaihuLight, levaria incríveis 2,5 bilhões de anos para realizar o mesmo cálculo feito pelo Ji aszhāng.

Esta foi apenas a segunda vez em que se conseguiu uma demonstração da supremacia quântica, que é um termo que descreve o ponto em que a performance de um computador quântico supera exponencialmente a de qualquer computador clássico, e realiza uma tarefa que, de outra forma, não poderia ser  computada.  Não é apenas uma demonstração de conceito; também há alguns indícios de que a amostragem Gaussiana de bósons poderia ter aplicações práticas, como a solução de problemas especializados em química quântica e matemática. De modo mais geral, a capacidade de controlar fótons como qubits é um pré-requisito para qualquer internet quântica em grande escala. (Um qubit é um bit quântico, análogo aos bits usados ​​para representar informações na computação clássica.)

“Não era óbvio que isso iria acontecer”, diz Scott Aaronson, um cientista da computação teórico agora na Universidade do Texas em Austin que, junto com o então aluno Alex Arkhipov, primeiro delineou os fundamentos da amostragem de bósons em 2011. Por muitos anos, experimentos de amostragem de bósons estiveram limitados a detectar de três a cinco fótons. “É difícil aumentar a quantidade”, diz ele Aaronson. “Tiro o chapéu para eles.”

Nos últimos anos, a computação quântica passou de algo obscuro para um empreendimento multibilionário, reconhecido por seu impacto potencial na segurança nacional, na economia global e nos fundamentos da física e da ciência da computação. Em 2019, foi sancionado o U.S. National Quantum Initiative Act, que prevê investimentos de mais de US $ 1,2 bilhão em tecnologia quântica nos próximos 10 anos. Essa área também têm obtido muita atenção,  com promessas de cronogramas irrealistas  e afirmações bombásticas que garantem que os computadores quânticos tornarão os computadores clássicos totalmente obsoletos.

Esta mais recente demonstração do potencial da computação quântica, feita pelo grupo USTC, é crítica porque difere drasticamente da abordagem do Google. O Sycamore usa loops de metal supercondutor para formar qubits; no Jiŭzhāng, os próprios fótons são os qubits. A corroboração independente de que os princípios da computação quântica podem proporcionar a supremacia de performance  mesmo empregando-se um hardware totalmente diferente “nos dá confiança de que, a longo prazo, simuladores quânticos úteis e um computador quântico tolerante a falhas se tornarão viáveis”, diz Lu.

Por que os computadores quânticos têm tamanho potencial? Considere o famoso experimento de dupla fenda, no qual um fóton é disparado em uma barreira com duas fendas, A e B. O fóton não passa por A ou B. Em vez disso, o experimento de dupla fenda mostra que o fóton existe em uma “superposição”, ou combinação de possibilidades, de ter passado por A e B. Em teoria, a exploração das propriedades quânticas, como a superposição, permite que os computadores quânticos alcancem uma velocidade muito maior do que as máquinas clássicas quando aplicados a certos problemas específicos.

Os físicos no início dos anos 2000 estavam interessados ​​em explorar as propriedades quânticas dos fótons para fazer um computador quântico, em parte porque os fótons podem atuar como qubits em temperatura ambiente. Isso elimina a custosa tarefa de resfriar o sistema até a temperatura de apenas alguns graus Kelvin, o que é necessário no caso de alguns  esquemas de computação quântica. Mas rapidamente ficou claro que construir um computador quântico fotônico universal era inviável. Mesmo  construir um computador quântico funcional exigira  milhões de lasers e de outros dispositivos ópticos. Como resultado, alcançar a supremacia  quântica empregando fótons parecia ser algo inalcançável.

Então, em 2011, Aaronson e Arkhipov introduziram o conceito de amostragem de bósons, mostrando como permitia a construção de um computador quântico limitado, feito de apenas alguns lasers, espelhos, prismas e detectores de fótons. De repente, havia um modo  para os computadores quânticos fotônicos mostrassem que podiam ser mais rápidos do que os computadores clássicos.

O arranjo experimental necessário para uma  amostragem de bósons é análogo ao chamado tabuleiro de Galton. Nele, bolas são colocados na parte superior do tabuleiro e, enquanto descem, ricocheteiam em obstáculos e umas nas outras  até que por fim caem em compartimentos na parte inferior. Para um computador clássico, simular a distribuição das bolas nos diferentes compartimentos é algo simples.

Ao invés de bolinhas, a amostragem de bósons utiliza fótons, e substitui os obstáculos por espelhos e prismas. Os fótons dos lasers refletem nos espelhos e atravessam os prismas até que chegam a um “compartimento”onde eles são detectados.   Mas diferentemente do que ocorre com as bolas, as propriedades quânticas dos fótons fazem com que o número de possíveis combinações da distribuição dos fótons entre os compartimentos cresça de forma exponencial.

O problema que a amostragem de bóson resolve é, basicamente, “Qual é a distribuição dos fótons?” A amostragem de bósons é um computador quântico que resolve o problema   ao tornar-se a  distribuição dos fótons. Enquanto isso, um computador clássico precisa descobrir qual é a distribuição dos fótons calculando o que é chamado de “permanente” de uma matriz. Para um input  de dois fótons, trata-se  apenas de um pequeno cálculo de uma matriz dois por dois. Mas à medida que o número de entradas e detectores fotônicos aumenta, o tamanho da matriz aumenta, e a complexidade computacional do problema cresce exponencialmente.

No ano passado, o grupo da USTC demonstrou o método da amostragem de bósons com 14 fótons detectados – algo difícil de ser calculado por  laptop, mas uma tarefa fácil para um supercomputador. Para ganhar escala até o nível da supremacia quântica, eles usaram um protocolo ligeiramente diferente, a amostragem gaussiana de bósons .

De acordo com Christine Silberhorn, especialista em óptica quântica da Universidade de Paderborn na Alemanha e um dos co-desenvolvedores da amostragem gaussiano de bósons, a técnica foi projetada para evitar os fótons únicos não confiáveis ​​usados ​​na amostragem de bósons “comum” de Aaronson e Arkhipov.

“Eu realmente queria torná-la prática”, diz ela. “É um arranjo  específico para ser usado  experimentalmente”.

Mesmo assim, ela reconhece que a configuração do USTC é assustadoramente complicada. O Jiŭzhāng começa com um laser que é dividido para atingir 25 cristais feitos de  fosfato de titanil potássio. Depois que cada cristal é atingido, ele emite dois fótons em direções opostas. Os fótons são então enviados por 100 entradas, onde correm por uma trilha feita de 300 prismas e 75 espelhos. Finalmente, os fótons pousam em 100 slots onde são detectados. Ao longo de várias rodadas totalizando 200 segundos de experimentos,  o grupo do USTC detectou cerca de 43 fótons por rodada. Mas, em uma dada rodada,  eles observaram 76 fótons – mais do que o suficiente para justificar sua alegação de supremacia  quântica.

É difícil estimar quanto tempo seria necessário para um supercomputador resolver uma distribuição envolvendo  76 fótons detectados – em grande parte porque não é exatamente viável rodar um supercomputador durante 2,5 bilhões de anos a fim de fazer uma observação direta. Em vez disso, os pesquisadores extrapolam o tempo que foi necessário para calcular, de forma clássica, quantidades menores de fótons detectados. Na melhor das hipóteses, dizem os pesquisadores, um cálculo envolvendo  50 fótons demandaria dois dias em um supercomputador, o que é muito mais do que o tempo de execução de 200 segundos do Jiŭzhāng.

Daniel Garisto

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