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Estudo propõe explicação para as enigmáticas e altíssimas temperaturas da corona solar

Graças ao uso de satélites, cientistas começam a detectar as causas que fazem com que temperatura na região da atmosfera seja milhares de vezes mais alta do que na superfície solar

O Sol. Crédito: SOHO (ESA e NASA)

Um fenômeno detectado primeiro no vento solar pode ajudar a resolver um mistério antigo envolvendo o o Sol: por que a atmosfera solar é milhões de graus mais quente do que a superfície. 

Imagens captadas pelo satélite  Interface Region Imaging Spectrograph (conhecido como IRIS), que orbita a Terra, pelo instrumento  Atmospheric Imaging Assembly, conhecido como AIA, mostram evidências de que os anéis coronais  (também chamados de loops magnéticos) situados nas regiões mais baixas são aquecidos até atingirem a temperatura de milhões de graus Kelvin. 

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Pesquisadores da Universidade Rice, da Universidade de Colorado em Boulder e do Centro de Vôo Espacial Marshall, da Nasa, estão defendendo a hipótese de que  o aquecimento dos íons mais pesados, como o silício, acontece preferencialmente  na região de transição entre a cromosfera e a corona do Sol e no vento solar. 

Nessa região de transição formam-se continuamente loops de plasma magnetizado, que são semelhantes aos seus “primos” que se formam acima, na região da corona.  Eles são muito menores e mais difíceis de analisar. Mas há muito se pensa que é neles que atua o mecanismo de base magnética que é responsável por liberar explosões de energia na forma de nanolabaredas. 

Stephen Bradshaw, da Universidade Rice, e seus colegas estavam entre aqueles que suspeitavam dessa  possibilidade. Porém, antes do IRIS entrar em funcionamento, não havia evidências suficientes. O IRIS é um  espectrômetro construído especificamente para observar a região de transição. No estudo, que aparece na revista Nature Astronomy, os pesquisadores descrevem “clarões” nos loops  que apresentam fortes assinaturas espectrais de oxigênio e, especialmente, de íons  de silício mais pesados.  

A equipe de Bradshaw, que inclui o autor principal Shah Mohammad Bahauddin  e a astrofísica Amy Winebarger estudaram as imagens do IRIS que apresentam resolução suficiente para examinar em detalhes os loops que se formam nessa região de transição, e detectar bolsões onde havia  plasma super-quente. As imagens permitem analisar os movimentos e as temperaturas dos íons que estavam dentro dos loops através da luz que eles emitem, que são lidas na forma de linhas espectrais que funcionam como uma espécie de “impressão digital”. “É nas linhas de emissões que a física fica registrada”, diz Bradshaw. “A ideia era aprender como essas pequenas estruturas se aquecem, na esperança de que isso revelasse algo sobre o modo como a própria corona é aquecida. Esse pode ser um mecanismo geral, que está em atividade em toda a atmosfera solar.” 

Os pesquisadores estudaram dois componentes do mecanismo: o modo como a energia sai do campo magnético, e como ela aquece o plasma. 

As imagens revelaram certas regiões do espectro onde as linhas espectrais foram ampliadas graças à ação do efeito Doppler e de  efeitos térmicos e Doppler. Isso revela não apenas quais são os elementos envolvidos nos nanoflares, mas também suas temperaturas e velocidades. Nessas regiões do espectro, eles encontraram loops  contendo íons de silício que apresentavam desvios para o azul e para o vermelho,  a velocidades de até 100 quilômetros por segundo. Nenhum desvio Doppler foi detectado para os íons de oxigênio mais leves.

A temperatura na região de transição é de  cerca de 5500 graus Celsius, mas os movimentos de convecção na superfície do Sol afetam os loops, torcendo  e trançando as finas linhas magnéticas que os sustentam, e adiciona  energia ao campo magnético, o que por fim aquece o plasma, disse Bradshaw. “As observações do IRIS mostraram esses  processos acontecendo. E temos quase certeza de que pelo menos uma resposta ao primeiro problema é a reconexão magnética, da qual os jatos são uma evidência  essencial”, ele disse. 

Nesse processo, os campos magnéticos do plasma se quebram e se reconectam em estados com menos energia, liberando assim energia magnética armazenada. Nos lugares onde ocorre esse fenômeno acontece, o plasma superaquece. 

Mas ainda não se sabe de que forma o plasma é aquecido pela energia magnética liberada. “Nós observamos partes desses pequenos loops onde estava ocorrendo a reconexão,  e medimos as linhas de emissão desses íons, principalmente de silício e de oxigênio”, ele disse. “Descobrimos que as linhas espectrais dos íons de silício eram muito maiores do que as de íons de oxigênio.” 

Essa observação indicou um aquecimento preferencial nos íons de silício. “Era preciso explicar isso”, disse Bradshaw. Os pesqiusadores recorreram então a  processo cinético chamado de ressonância ciclotrônica de íons, que favorece o aquecimento de íons pesados em detrimento dos mais leves. 

Ondas ciclotrônicas são geradas em locais de reconexão. As ondas carregadas pelos íons mais pesados são mais suscetíveis a uma instabilidade que faz com que as ondas “quebrem” e geram turbulência, que espalha e energiza os íons. Isso amplifica suas linhas espectrais mais do que ocorreria apenas pelo efeito da temperatura local do plasma. No caso dos íons mais leves, pode não haver energia suficiente para aquecê-los. 

“No vento solar, os íons mais pesados são significativamente mais quentes do que íons mais leves”, disse Bradshaw. “Isso foi medido definitivamente. Nosso estudo mostra, pela primeira vez, que isso também é uma propriedade da região de transição, e pode, portanto, persistir pela atmosfera inteira devido ao mecanismo que identificamos, incluindo o aquecimento da corona solar. Em particular porque o vento solar é uma manifestação da corona se expandindo para o espaço interplanetário”. 

A próxima questão a ser respondida, disse Bahauddin, é se esse  fenômeno está acontecendo simultaneamente por todo o Sol. “O mais provável é que a resposta seja negativa”, ele disse. “Então, a pergunta é”o quanto ele contribui para o fenômeno do aquecimento da corona? Ele seria capaz de fornecer energia suficiente para a atmosfera superior a fim de manter  uma corona com milhões de graus?” 

“Nosso estudo sobre  a região de transição soluciona uma parte importante do quebra-cabeça, mas uma solução definitiva exige mais respostas”, disse Bahauddin. “Eu acredito que o IRIS conseguirá nos dizer sobre os pedaços cromosféricos no futuro próximo. Isso irá nos ajudar a construir uma teoria unificada e global sobre a atmosfera do Sol”.

 

Publicado em 10/12/2020

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