DNA com formato circular pode explicar surgimento de câncer em crianças
O desenvolvimento de um câncer está associado ao acúmulo gradual de defeitos no DNA ao longo do tempo. Por isso, o câncer é considerado uma doença relacionada à idade. Mas por que crianças também desenvolvem câncer? Uma equipe internacional de pesquisadores, liderada pela Charité – Universitätsmedizin Berlin, na Alemanha, e pelo Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York, agora revela que anéis misteriosos de DNA conhecidos como DNA circular extracromossômico podem contribuir para o desenvolvimento de câncer em crianças. Ao produzir o primeiro mapa detalhado do DNA circular, os cientistas mostraram novas descobertas inéditas sobre questões de longa data no campo da genética do câncer. O trabalho foi publicado na revista Nature Genetics.
Todos os anos, quase meio milhão de pessoas na Alemanha desenvolvem câncer. Aproximadamente 2.100 pacientes com câncer são pessoas com menos de 18 anos. O fato de a maioria dos cânceres se desenvolver em adultos idosos se deve aos mecanismos que contribuem para o desenvolvimento da doença. Uma variedade de fatores exógenos, incluindo fumaça de cigarros e radiação, podem causar danos ao DNA celular. Se esse tipo de dano for se acumulando ao longo de muitos anos, as células afetadas podem perder o controle sobre a divisão e o crescimento celulares. Isso resulta no desenvolvimento do câncer. Crianças, no entanto, não têm idade suficiente para serem afetadas por esse mecanismo. Qual é, então, a causa dos cânceres na infância?
Uma equipe de pesquisadores, liderada pelo Anton Henssen do Departamento de Pediatria de Charité, está agora bem perto de encontrar uma resposta. Trabalhando em conjunto com uma equipe de cientistas liderada por Richard Koche do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, além de outros parceiros internacionais, o grupo conseguiu mostrar que círculos de DNA podem causar falhas na informação genética de nossas células, o que pode contribuir para desenvolvimento de câncer.
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Os cientistas conhecem essas seções de DNA em forma de anel há décadas. Encontradas dentro de nossas células, elas não fazem parte de nossas informações genéticas normais, que são armazenadas na forma de cromossomos. É por esse motivo que elas são chamadas de DNA circular extracromossômico. Mas, mesmo hoje em dia, a comunidade científica sabe relativamente pouco sobre sua função, principalmente porque faltam tecnologias para uma análise mais detalhada.
No novo estudo, os pesquisadores combinaram técnicas de sequenciamento de ponta com algoritmos pioneiros de bioinformática para realizar o primeiro mapeamento detalhado do DNA circular do neuroblastoma, um tumor mortal na infância. Com base em suas descobertas, os pesquisadores foram capazes de tirar conclusões importantes sobre o desenvolvimento desse tipo de câncer.
Trabalhando em conjunto com o Centro Nacional de Supercomputación de Barcelona, os pesquisadores analisaram amostras de tecido de neuroblastoma de um total de 93 crianças. A análise revelou que a prevalência e diversidade do DNA circular é muito maior do que o previsto anteriormente. De acordo com as descobertas dos pesquisadores, cada amostra de tecido continha em média 5.000 cópias de DNA circular. O sequenciamento do DNA também revelou o processo pelo qual seções específicas do código genético se separam de um cromossomo para formar DNA circular antes de se reintegrar no cromossomo em um local diferente. “Isso pode causar câncer se resultar na interrupção da sequência original de informações genéticas”, explica Henssen, que também é pesquisador do German Cancer Consortium (DKTK) em Berlim e cientista clínico do Instituto de Saúde de Berlim (BIH). Salientando a importância das descobertas dos pesquisadores, Henssen diz: “Os processos envolvidos não haviam sido elucidados dessa maneira até então, e fornecem informações sobre como mesmo células jovens, como as encontradas em crianças, podem se transformar em células cancerígenas”.
“Também fomos capazes de mostrar que certos tipos de DNA circular podem acelerar o crescimento de neuroblastomas”, explica Koche. “Testar a presença deles pode facilitar a previsão do curso da doença. Além disso, o estudo desse processo em genomas relativamente silenciosos desses tumores pediátricos podem ajudar a iluminar mecanismos semelhantes que antes eram esquecidos em cânceres adultos mais complexos. Dado o recente interesse no DNA circular em uma variedade de contextos e de doenças, o novo estudo pode ter implicações para uma ampla gama de tipos de tumores e resultados clínicos.”
O grupo de pesquisa planeja realizar outros estudos para verificar a validade diagnóstica do DNA circular. “Também queremos realizar pesquisas mais detalhadas sobre as origens do DNA circular, a fim de entender melhor por que as crianças desenvolvem câncer”, diz Henssen.
Charité – Universitätsmedizin Berlin