Coronavírus está evoluindo para escapar das vacinas atuais, prediz novo estudo
As variantes britânicas e sul-africana do coronavírus SARS-CoV-2 podem ser capazes de reduzir a eficácia de neutralização das vacinas atuais e de alguns anticorpos do tipo monoclonais. É o que prevê um novo estudo publicado na revista Nature na última segunda (8). Com essas novas variantes, as reinfecções também podem ser mais prováveis.
Os cientistas alertam que se a disseminação desenfreada do vírus perseverar, e se se acumularem mais mutações comprometedoras, a humanidade estará fadada a uma contínua perseguição contra as novas variantes do SARS-CoV-2 que forem surgindo, nos moldes do que acontece hoje no combate ao vírus da gripe. “Essas considerações indicam que devemos interromper a transmissão do vírus o mais rápido possível, ao redobrarmos as medidas de mitigação, e pela aceleração no desenvolvimento de vacinas”, diz David Ho, diretor do Aaron Diamond AIDS Centro de Pesquisa e Professor da Universidade de Columbia.
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A variante mais recente encontrada no Brasil (B.1.1.28) não foi analisada pelo estudo. Mas, em função da semelhança nas mutações da proteína spike detectadas entre as variantes do Brasil e da África do Sul, elas podem se comportar de forma parecida.
As previsões apresentadas no artigo estão sendo confirmadas agora pelos primeiros resultados da vacina Novavax. A empresa relatou, em 28 de janeiro, que a vacina apresentou quase 90% de eficácia na fase de testes do Reino Unido. Já na África do Sul, onde a maioria dos casos de COVID-19 são causados pela variante B.1.351, a eficácia foi de 49,4%.
“Nosso estudo, e os novos dados de testes clínicos, mostram que o vírus está seguindo um caminho que lhe permite escapar das nossas vacinas e das terapias atuais, que são projetadas para agir sobre a proteína spike do SARS-CoV-2”, diz Ho, em referência à proteína usada pelo vírus para penetrar nas células infectadas.
As vacinas e os tratamentos com anticorpos monoclonais — as células de defesa usadas no tratamento de pacientes com COVID — atuam a partir do reconhecimento dessa proteína. Por isso, a equipe examinou todas as mutações associadas às proteína spike das duas variantes analisadas. Eles criaram pseudo-vírus SARS-CoV-2, dotados de uma estrutura celular similar, mas incapazes de causar infecção, utilizando as oito mutações encontradas na variante do Reino Unido e as nove mutações encontradas na variante sul-africana. A seguir, mediram a sensibilidade desses pseudo-vírus aos anticorpos monoclonais aplicando o soro com dois grupos de pacientes: aqueles infectados no início da pandemia e outros vacinados com os imunizantes da Moderna ou da Pfizer.
A equipe descobriu que os anticorpos encontrados em amostras de sangue de pessoas inoculadas com as vacinas da Moderna ou da Pfizer se mostraram duas vezes menos eficazes na neutralização da B.1.1.7 (que surgiu na Inglaterra em setembro) e cerca de 6,5 vezes a 8,5 vezes menos eficaz em relação a B.1.351, que emergiu da África do Sul no final de 2020.
A redução da atividade neutralizante em relação à variante britânica não implicaria em cenários tão preocupantes, segundo Ho. Porém, em relação à sul-africana, há efeitos sobre a capacidade protetora.
Outra descoberta do estudo foi em relação aos anticorpos monoclonais: eles podem não funcionar tão bem, ou até muito pouco contra a variante sul-africana. A análise do plasma de pacientes infectados no início da pandemia, mostrou que a variante B.1.351 da África do Sul tem o potencial de causar reinfecção.
Esses anticorpos incluem o uso do bamlanivimab (LY-CoV555), o primeiro remédio especificamente desenvolvido para combater a COVID e aprovado para uso nos Estados Unidos, que se mostrou completamente inativo contra a variante da África do Sul; e o casirivimabe, um dos dois anticorpos que faz parte de um coquetel de anticorpos aprovado (REGN-COV) que foi 58 vezes menos eficaz na neutralização da variante da África do Sul em comparação com o vírus original. O segundo anticorpo do coquetel, o imdevimab, manteve sua capacidade de neutralização, assim como o coquetel completo.
“As decisões sobre o uso desses tratamentos dependerão muito da prevalência local das variantes da África do Sul e do Brasil”, diz Ho. “O que nos preocupa é que, se alguém se deparar com estas variantes, as chances de reinfecção são maiores, especial no caso da variante da África do Sul.”
Publicado em 10/03/2021