Colombo levou a sífilis para a Europa?
Aparentemente, o Novo Mundo não foi só o que o intrépido explorador Cristóvão Colombo descobriu. Parece que também devemos a ele a difusão do patógeno causador da sífilis – além de notícias das Américas – pela Europa.
Um novo estudo traz evidências que, de acordo com os cientistas, são as mais claras até agora de que o aventureiro italiano e parte de sua tripulação contraíram a doença durante a expedição para o Novo Mundo – e, sem querer, a introduziram no Velho Mundo em 1493.
A pesquisa é o ponto alto de séculos de debates sobre a doença ter se desenvolvido a partir de uma bactéria originária do Velho ou do Novo Mundo.
Pesquisadores da Emory University, em Atlanta, relataram na publicação online PLoS Neglected Tropical Diseases que usaram filogenética – um estudo da ligação evolucionária entre organismos – para estudar 26 linhagens dispersas de uma família de bactérias conhecida como Treponemas, causadora da sífilis, uma doença sexualmente transmissível, e também de infecções não-venéreas, como a bouba (um tipo de erupção cutânea). Eles descobriram que as linhagens que causam a sífilis venérea apareceram em um período relativamente recente na história humana, e estão intimamente relacionadas a uma antiga infecção isolada na América do Sul que causa bouba.,“Isso corrobora a hipótese de que a sífilis – ou algum precursor dessa doença – veio do Novo Mundo,” – declarou Kristin Harper, pesquisadora de genética molecular na Emory e principal autora do estudo.
De acordo com os pesquisadores, a origem da sífilis tem sido debatida acaloradamente desde a primeira epidemia registrada na Europa, em 1495. A maior parte das evidências científicas recentemente foi obtida de ossos de membros de civilizações antigas, tanto do Novo quanto do Velho Mundo; os ossos eram considerados marcadores confiáveis já que a sífilis crônica causa lesão esquelética. No entanto, as análises dos ossos foram dificultadas pela incapacidade de determinar sua idade com precisão, e também pela falta de evidências epidemiológicas.
Outro empecilho potencial é o fato das bactérias Treponema causarem doenças que compartilham sintomas similares, mas são transmitidas de maneiras diferentes. A sífilis é sexualmente transmissível, enquanto que a bouba e a sífilis crônica são doenças tropicais que se espalham pelo contato oral ou pela pele. Uma hipótese é que subespécies de Treponema das Américas tropicais tenham se transformado em linhagens venéreas e mais virulentas, causadoras de sífilis, para conseguirem sobreviver aos climas mais amenos da Europa.
Os cientistas dizem que o estudo é significativo por causa do grande número de linhagens analisadas, incluindo duas espécies de boubas encontradas em habitantes isolados nas Guianas.
“A sífilis foi uma grande assassina na Europa durante o Renascimento”, conta George Armelagos, biólogo da Emory especializado no estudo do esqueleto e co-autor da pesquisa, e que estuda a doença há três décadas. “Compreender sua evolução é importante não apenas para a biologia, mas também para entender a história social e política. Poderíamos dizer que a sífilis é um dos primeiros e mais importantes exemplos de doença globalizada, e a globalização permanece um fator importante para as doenças emergentes.”