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Cientistas criam estados quânticos em dispositivos eletrônicos comuns

A descoberta poderia oferecer um meio para distribuir informação quântica através de redes de fibra ótica já existentes

Kevin Miao, Chris Anderson e Alexandre Bourassa durante um experimento quântico na Universidade de Chicago. Foto: David Awschalom

Após décadas de intenso processo de miniaturização, os componentes eletrônicos que usamos nos computadores e nas demais tecnologias modernas estão começando a esbarrar em limites fundamentais. Diante desse desafio, engenheiros e cientistas de todo o mundo estão se voltando para um paradigma radicalmente novo: as tecnologias de informação quântica.

A tecnologia quântica, que utiliza as estranhas regras que governam as partículas no nível atômico, normalmente é considerada delicada demais para coexistir com a eletrônica que usamos no dia-a-dia em telefones, laptops e carros. No entanto, cientistas da Escola Pritzker de Engenharia Molecular, da Universidade de Chicago, anunciaram um avanço significativo: os estados quânticos podem ser integrados e controlados em dispositivos eletrônicos comuns, feitos de carboneto de silício.

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“A capacidade de criar e controlar bits quânticos de alto desempenho em eletrônicos comerciais foi uma surpresa”, diz o pesquisador principal David Awschalom, professor de engenharia molecular na Universidade de Chicago e pioneiro em tecnologia quântica. “Essas descobertas mudaram a maneira como pensamos o desenvolvimento de tecnologias quânticas — talvez possamos encontrar uma maneira de usar eletrônicos atuais para construir dispositivos quânticos”.

Em dois artigos publicados nas revistas Science e Science Advances, a equipe demonstrou que conseguiu controlar eletricamente os estados quânticos embutidos em carboneto de silício. Essa inovação poderia oferecer um meio para projetar e construir com mais facilidade equipamentos eletrônicos quânticos — em contraste com os materiais exóticos que os cientistas geralmente precisam utilizar para experiências quânticas, como metais supercondutores, átomos levitados ou diamantes.

Esses estados quânticos no carboneto de silício têm o benefício adicional de emitir partículas individuais de luz com comprimento de onda próximo à banda de telecomunicações. “Isso os torna adequados para a transmissão de longa distância através da mesma rede de fibra ótica que já transporta 90% de todos os dados internacionais em todo o mundo”, disse Awschalom, que também cientista sênior do Laboratório Nacional Argonne e diretor do Chicago Quantum Exchange.

Além disso, essas partículas de luz podem obter novas propriedades quando combinadas com os eletrônicos existentes. Por exemplo, como relatado na revista Science Advances, a equipe conseguiu criar o que Awschalom chamou de “rádio FM quântico”. Da mesma forma que a música é transmitida até o rádio do carro, por exemplo, informações quânticas podem ser enviadas por distâncias extremamente longas.

“Toda a teoria sugere que, para alcançar um bom controle quântico em um material, ele deve ser puro e livre de campos flutuantes”, diz Kevin Miao, pós-graduando e primeiro autor do artigo. “Nossos resultados sugerem que, com o design adequado, um dispositivo pode não apenas mitigar essas impurezas, mas também criar formas de controle adicionais que antes não eram possíveis”.

No artigo publicado na Science, os pesquisadores descrevem um segundo avanço que aborda um problema muito comum na tecnologia quântica: o ruído.

“Impurezas são comuns em todos os dispositivos semicondutores e, no nível quântico, essas impurezas podem embaralhar as informações quânticas criando um ambiente elétrico com muito ruído”, diz Anderson, pós graduando e primeiro autor do artigo. “Este é um problema quase universal para tecnologias quânticas”.

Mas, usando um dos elementos básicos da eletrônica —  o diodo, um interruptor unidirecional para elétrons — a equipe encontrou outro resultado inesperado: o sinal quântico repentinamente ficou livre de ruídos e ficou quase perfeitamente estável.

“Em nossos experimentos, precisamos usar lasers, que infelizmente empurram os elétrons. É como uma dança das cadeiras com elétrons: quando a luz se apaga, tudo para, mas em uma configuração diferente”, diz Alexandre Bourassa, pós-graduando e outro primeiro autor do artigo. “O problema é que essa configuração aleatória de elétrons afeta nosso estado quântico. Mas descobrimos que a aplicação de campos elétricos remove os elétrons do sistema e o torna muito mais estável”.

Ao integrar a estranha física da mecânica quântica com a bem desenvolvida tecnologia clássica de semicondutores, Awschalom e seu grupo estão abrindo o caminho para a próxima revolução da tecnologia quântica.

“Este trabalho nos aproxima um passo da realização de sistemas capazes de armazenar e distribuir informações quânticas em redes de fibra ótica do mundo”, diz Awschalom. “Essas redes quânticas trariam uma nova classe de tecnologias, permitindo a criação de canais de comunicação impossíveis de hackear, o teletransporte de estados de elétrons individuais e a realização de uma internet quântica”.

Universidade de Chicago

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