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Bactérias de cratera de vulcão na Terra podem ajudar na busca por vida em Marte

Presença de bactérias em ambientes extremos sugere novos locais para busca por vida em Marte: as crateras hidrotermais, comuns no passado do planeta.
Crateras terrestres orientam busca por vida em Marte.

Crateras hidrotermais podem dar dicas para busca por vida em Marte. Crédito: Justin Wang (pesquisador)

Os lagos ácidos em crateras de vulcões estão entre os ambientes mais hostis do planeta. Variações bruscas de temperatura, erupções hidrotermais constantes e substâncias tóxicas impossibilitam a sobrevivência da maioria das espécies. Porém, um estudo identificou que bactérias do gênero Acidiphilium são dominantes nesses ambientes análogos ao passado de Marte, devido a uma gama de adaptações, abrindo novos caminhos para busca por vida.

O estudo, publicado no periódico Frontiers in Astronomy and Space Science, analisou a presença destas bactérias no lago hidrotermal da cratera do vulcão Poás, na Costa Rica. Sua água é extremamente ácida, abarrotada de metais tóxicos, e as temperaturas podem elevar-se rapidamente de níveis confortáveis até mais de 100°C. Além disso, ocorrem constantes erupções freáticas, lançando rochas, água fervente, cinza e vapor acumulados abaixo do solo.  

Apesar de extremas para os padrões atuais, essas condições são semelhantes às da Terra primitiva, há quase 4 bilhões de anos, nas quais cientistas acreditam que se originaram os primeiros organismos vivos. Mas a Terra não foi o único planeta a passar por este tipo de atividade vulcânica durante sua história. Evidências geológicas atuais apontam que o passado de Marte foi semelhante, e o planeta era repleto de crateras com atividade hidrotermal.

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Portanto, estudar essas bactérias, chamadas de “extremófilas” — seres que precisam de condições extremas, que seriam mortíferas para a maioria das formas de vida, para sobreviver — pode ajudar a expandir a atual busca por vida em Marte. Atualmente, os esforços estão focados em ambientes menos extremos, como antigos deltas de rios e leitos de córregos (hoje secos).

“Uma de nossas descobertas-chave foi que, dentro deste lago extremamente vulcânico, detectamos apenas alguns tipos de microorganismos, ao lado de diversas maneiras para que eles sobrevivam”, afirma Justin Wang, principal autor do estudo. Ele é pós-graduado na Universidade de de Colorado em Boulder (EUA) e estuda conexões entre a biologia terrestre e os ambientes de Marte. “Acreditamos que eles fazem isso ao sobreviver nas margens do lago quando as erupções acontecem. É nesses momentos que ter uma variedade relativamente extensa de genes pode ser útil.”

Paisagem do lago na cratera.

Paisagem do lago da cratera do vulcão Poás, Costa Rica. Crédito: Justin Wang (pesquisador)

Genes extremos

O estudo atual parte de um trabalho de 2013, no mesmo local, que identificou que apenas as bactérias Acidiphilium sobreviviam no lago. A equipe retornou em 2017 após uma série de erupções para analisar possíveis mudanças na biodiversidade — novos tipos de bactérias foram identificados, porém as Acidiphilium mantiveram seu domínio

Além disso, o estudo buscou compreender em mais detalhes a bioquímica destas bactérias — muitas delas também encontradas, talvez pouco surpreendentemente, em drenagens ácidas de mineração. O sequenciamento de seu DNA, mostrou que elas possuíam genes capazes de diversos processos bioquímicos especiais. Alguns exemplos são: meios de utilizar a energia de enxofre, ferro e arsênio; capacidade de fixação de carbono (absorver e utilizar carbono em suas estruturas, como fazem as plantas) uso de moléculas de açúcares simples e complexas e até de grânulos bioplásticos, que são produzidos com materiais presentes no lago e podem servir de fonte de carbono e energia em períodos de “fome” ou estresse.

“Nós esperávamos muitos dos genes que encontramos, mas não esperávamos tantos assim, devido a baixa biodiversidade do lago”, explicou Wang. “Isso foi uma boa surpresa, mas é absolutamente elegante. Faz todo sentido que essa é a maneira que a vida se adaptaria a viver em um lago em uma cratera de um vulcão ativo“.

Pessoa na cratera.

Pesquisador realizando trabalho de campo na cratera. Crédito: Justin Wang (pesquisador)

Extremófilos marcianos

Apesar da hostilidade desses locais, eles possuem muitos dos pré-requisitos para sobrevivência da vida como a conhecemos: calor, água e energia. Analogamente, as crateras hidrotermais no passado de Marte poderiam ter as mesmas condições — e compartilhar muitos dos mesmos ingredientes. Dessa forma, os pesquisadores acreditam que as buscas por seres vivos (ou por evidências de presença biológica já extinta) em Marte poderiam dar mais atenção a esses ambientes

“Nossa pesquisa provém uma base para teorias de como ‘vida terrestre’ poderia ter existido em ambientes hidrotermais em Marte”, afirma Wang. “Mas se vida alguma vez já existiu no planeta ou se ela se pareceria com os microrganismos que temos por aqui ainda é uma grande dúvida. Esperamos que nossa pesquisa direcione a discussão para priorizar pesquisas por sinais de vida nesses ambientes. Por exemplo, existem alguns bons alvos nas bordas da Cratera Jezero, onde o rover Perseverance [da NASA] está neste momento”.

Publicado em 02/02/2022.

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