Astrônomos podem ter capturado a primeira imagem de Proxima C, o exoplaneta mais próximo
Poucas coisas são mais sedutoras que a perspectiva de enxergar mundos alienígenas ao redor de outras estrelas — e talvez um dia estudar sua atmosfera e sua superfície. Tais observações são extremamente difíceis, claro. Apesar de conhecermos mais de 4.000 exoplanetas, a vasta maioria deles fica longe demais e é escura demais, dificultando que mesmo nossos melhores telescópios os enxerguem contra o brilho de sua estrela hospedeira. Porém, os exoplanetas que estão mais perto do nosso sistema solar fornecem oportunidades mais fáceis para observações. E nenhum mundo está mais próximo de nós do que aqueles que orbitam a gelada e enfraquecida estrela anã Proxima Centauri — a estrela mais próxima do nosso Sol, a 4,2 anos luz de distância.
Em 2016, astrônomos descobriram o primeiro planeta nesse sistema: Proxima b, que tem aproximadamente o tamanho da Terra. Mas por conta de sua órbita muito próxima da estrela, completada a cada 11 dias, Proxima b é uma má escolha para se obter imagens. .Já Proxima c, por outro lado, oferece chances muito melhores. Sua possível existência foi anunciada em 2019, com base em algumas evidências circunstanciais, mas o planeta permanece não confirmado. Se for real, estima-se que tenha uma massa muito maior que a da Terra — pertenceria à categoria das Super Terras ou mini Netunos — e sua órbita em torno de Proxima Centauri equivale a cerca de 1,5 vezes a órbita da Terra em torno do Sol. Seu tamanho e sua distância da estrela fazem desse mundo um alvo tentador para atuais e futuros projetos de observação de exoplanetas. Agora, segundo um artigo em pré-publicação que foi aceito para publicação na revista Astronomy & Astrophysics, alguns astrônomos dizem que talvez — apenas talvez — tenham conseguido visualizar Proxima C pela primeira vez.
++ LEIA MAIS:
http://sciam.com.br/astronomos-podem-ter-capturado-a-primeira-imagem-de-proxima-c-o-exoplaneta-mais-proximo/
http://sciam.com.br/estudante-de-astronomia-encontra-planeta-semelhante-a-terra-em-zona-habitavel-e-mais-16-novos-exoplanetas/
“Esse planeta é interessante porque [Proxima] é uma estrela muito próxima do Sol”, diz Raffaele Graton do Observatório Astronômico de Padova na Itália, que é o autor principal do estudo. “A ideia era que, desde esse planeta está longe da estrela, seria possível observá-lo em imagens diretas. Descobrimos um candidato razoável, que faz parecer que realmente detectamos o planeta”.
Ano passado, Gratton e sua equipe foram alertados inicialmente sobre a possibilidade de visualizar o planeta por Mario Damasso do Observatório de Astrofísica em Turin, na Itália, que foi o principal autor do estudo original da possível descoberta de Proxima c. Damasso e seus colegas apresentaram evidências para a existência de Proxima c a partir de uma expressiva oscilação observada na estrela, que deduziram ser causado pelo empuxo de um planeta ainda não observado em sua órbita. Para confirmar a existência de um planeta seguindo esse método exige que se veja a mesma oscilação de novo e de novo, em um processo que geralmente leva muitos meses ou mesmo anos. Damasso se perguntou se poderia haver alguma outra maneira. Assim, pediu a Gratton e sua equipe para darem uma olhada nos dados do instrumento SPHERE ( Pesquisa de Exoplaneta de Espectro-Polarimétrico de Alto Contraste) no Very Large telescope (VLT), do Observatório Europeu do Sul no Chile, para ver se realmente poderiam observar o planeta. “Assim que nossa pesquisa sobre Proxima c foi analisada para publicação, contatei [Gratton] para discutir a possibilidade de levar a SPHERE à seus limites”, diz Damasso. “O sistema [planetário] é potencialmente tão interessante que é válido tentar outras técnicas”.
Se você “piscar os olhos” um pouco enquanto vê os dados da SPHERE, parece que surge uma imagem do misterioso planeta. Ao analisarem a posição estimada para o Proxima c e a distância de sua estrela usando múltiplas imagens em infravermelho da SPHERE agrupadas, Gratton e seus colegas conseguiram captar 19 possíveis aparições do planeta ao longo de vários anos de observação de rotina. Dentre essas possíveis detecções, uma se destacou como particularmente sedutora: apareceu nas imagens cerca de seis vezes mais luminosa que seu “ruído” — que é a luminosidade não desejada gerada por equipamentos ou estrelas de fundo. “É um possível candidato que tem uma baixa chance de ser um alarme falso”, diz Emily Rickman do Observatório de Geneva, que é coautor da pesquisa.
Se a detecção for genuína, ela implica em questões intrigantes. O objeto que se acredita ser o planeta teria pelo menos sete vezes a massa da Terra — grande o suficiente para colocá-lo na categoria de super Terra. “Isso seria definitivamente uma espécie de mini Netuno”, diz Sara Seager. uma professora de ciência planetária no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, que não estava envolvida na pesquisa. O objeto também aparenta ser de 10 a 100 vezes mais claro do que um planeta com sua massa deveria ser. Essa luminosidade, ponderam os autores do estudo, poderia ser causada por uma grande quantidade de poeira circulando o planeta, talvez em um vasto sistema de anéis que seria de três a quatro vezes maior que o de Saturno. Para alguns, essa situação parece estranha para ser verdade,
“Seria um imenso sistema de anéis ao redor de uma estrela relativamente antiga”, diz o astrofísico Bruce Macintosh da Universidade de Stanford, que também não fez parte da pesquisa. “É certamente possível que existam coisas assim. Mas para que essa seja a primeira detecção de algo assim, você teria que postular um universo no qual a maioria dos planetas do tamanho de Netuno possuem sistemas anelares massivos, muito maiores que o de Saturno. E esse parece um universo improvável para se viver”.
Se genuína, essa detecção — essa imagem — teria implicações profundas para o nosso entendimento dos nossos sistemas planetários vizinhos mais próximos. Isso nos daria provas definitivas da existência do Proxima c e também nos daria o ângulo no qual o planeta orbita sua estrela, em relação a nós — algo que as observações das oscilações da estrela não poderiam fornecer. A detecção também permitiria garantir que poderíamos em breve estudar a atmosfera do planeta com uma nova geração de poderosos observatórios, como o Telescópio Extremamente Lardo Europeu (E-ELT) e o Telescópio de Pesquisa de Campo Amplo Infravermelho (WFIRST) da NASA.
Talvez mais importante, localizar Proxima c também provavelmente revelaria o ângulo orbital de Próxima b, porque espera-se que planetas orbitam no mesmo plano, como acontece no nosso sistema solar. Essa informação, juntos com as oscilações que Proxima b causa em sua estrela, nos diriam que o planeta deve ter a massa em algum lugar entre 1,5 e 1,8 vezes a da Terra, o que nos permitirá refinar as teorias sobre suas características. Tal massa seria “uma forte sinalização de que [Próxima b] é rochoso”, diz Elizabeth Tasker, uma cientista de exoplanetas na Agência de Exploração Espacial Japonesa, que não estava envolvida na pesquisa. Como já sabemos que Proxima b orbita sua estrela em uma zona habitável, onde existe água líquida — e com ela, a vida, tal como nós a conhecemos — a constatação de que o planeta é rochoso iria catapultá-lo para o topo de qualquer lista de astrobiologia dos exoplanetas promissores.
Tais possibilidades espetaculares, entretanto, pedem por um ceticismo. De fato, o autor da nova pesquisa reconhece que existe uma boa chance de que sua imagem não seja na verdade um planeta, mas um ruído aleatório nos dados. Eles também notam que a movimentação aparente de seu suposto planeta conflita com estimativas iniciais da posição de Proxima c, baseado em observações da estrela feitas pela sonda espacial Gaia, da Agência Espacial Europeia. Assim, outros astrônomos estão tratando a possível descoberta com uma quantidade considerável de cuidado. “É difícil para mim concluir que [isso] é uma detecção decisiva”, diz Thayne Currie, uma cientista de exoplanetas no centro de pesquisa em Ames da NASA, que também não fez parte do estudo.
Infelizmente, o bloqueio global atual em resposta a pandemia de COVID-19 significa que o resultado não poderá ser checado no presente momento, porque a maioria dos observatórios do mundo — incluindo o VLT — não está operando. “Poderia ser [confirmado ou refutado] amanhã, mas os observatórios estão fechados” diz o astrônomo Guillem Anglada-Escudé, que liderou a descoberta de Próxima b em 2016 e não estava envolvido no novo estudo. O tempo está se esgotando para uma observação imediata: em julho Proxima Centauri irá deixar nosso campo de visão, ficando atrás do Sol até fevereiro de 2021.
Por agora, a perspectiva de Proxima c ter sido visto pela primeira vez permanece uma possibilidade sedutora porém obscura. Mesmo que prove ser uma miragem — um alarme falso astronômico — essa detecção em potencial não deve diminuir o entusiasmo para os próximos estudos. Outras equipes farão outras tentativas, com futuros instrumentos, mais avançados que SPHERE , que serão operados em telescópios gigantes como o E-ELT. Mas se a detecção for real, algo de que Gratton diz estar “dois terços” convicto, seria um histórico vislumbre inicial de um planeta orbitando a estrela mais próxima de nós. “Se isso for verdade, é muito emocionante” diz Anglada-Escudé.
Jonathan O’Callaghan
Publicado em 21/04/2020