Estudo pode ter encontrado estrela de nêutrons escondida por restos de supernova
Desde a explosão de uma estrela tipo supernova foi detectada em 24 de fevereiro de 1987, os astrônomos têm procurado os remanescentes do núcleo estelar explodido que deve ter sido gerado pelo evento. Agora, um grupo de pesquisadores que examinou dados de missões espaciais da Nasa e de telescópios terrestres pensa que pode ter respondido a questão.
A Supernova 1987A (ou SN 1987A para abreviar) foi a primeira explosão de supernova que pode ser visível a olho nu desde que surgiu a astronomia enquanto ciência, de 400 anos, mais ou menos, para cá. A supernova está localizada na Grande Nuvem de Magalhães, uma pequena galáxia companheira de nossa Via Láctea, e fica a apenas 170 mil anos-luz da Terra.
Os astrônomos observaram material estelar remanescente, que foi projetado pela explosão, mas não encontraram aquilo que deveria ser o produto do núcleo da estrela que explodiu: uma estrela de nêutrons. Agora, dados do telescópio espacial Chandra de Raios X, da Nasa, e dados não publicados anteriormente do Nuclear Spectroscopic Telescope Array (NuSTAR), em combinação com dados gerados pelo Atacama Large Millimeter Array (ALMA) relatados no ano passado, apresentam uma coleção intrigante de evidências para a presença de uma estrela de nêutrons no centro de SN 1987A.
“Há 34 anos, os astrônomos vasculham os destroços estelares de SN 1987A em busca da estrela de nêutrons que esperamos estar lá”, disse o líder do estudo, Emanuele Greco, da Universidade de Palermo, na Itália. “Houve muitas pistas que se revelaram becos sem saída, mas achamos que nossos últimos resultados poderiam ser diferentes.”
Quando uma estrela de determinadas dimensões explode, ela colapsa sobre si mesma antes que suas camadas externas sejam projetadas no espaço. O colapso faz do núcleo um objeto extraordinariamente denso; equivale a comprimir toda a massa do Sol num objeto com apenas cerca de 30 km de diâmetro. Esses objetos são designados como estrelas de nêutrons, porque são feitos quase que exclusivamente de nêutrons densamente compactados.
Estrelas de nêutrons que apresentam rotação rápida e são altamente magnetizadas, chamadas pulsares, produzem um feixe de radiação semelhante a um farol, que os astrônomos detectam como pulsos que varrem o céu. Existe um subconjunto de pulsares que produzem ventos em suas superfícies – que às vezes alcançam velocidades próximas à da luz – que criam estruturas intrincadas de partículas carregadas e campos magnéticos conhecidos como “nebulosas de vento de pulsar”.
Usando os dados do Chandra e do NuSTAR, a equipe detectou raios X de energia relativamente baixa emanando dos remanescentes da SN 1987A que colidem com o material circundante. A equipe também encontrou evidências da existência de partículas de alta energia graças à capacidade do NuSTAR para detectar os raios X de maior energia.
Existem duas hipóteses para explicar essa emissão de raios X de alta energia: ou existe uma nebulosa de vento de pulsar, ou há partículas sendo aceleradas até altas energias pelos efeitos da onda de choque da explosão. A segunda hipótese não requer a presença de um pulsar, e pode ocorrer a distâncias muito maiores do centro da explosão.
Sob alguns aspectos, esse estudo mais recente usando raios X vai contra a hipótese da aceleração causada pela onda gerada pela explosão e apóia a hipótese da nebulosa de vento de pulsar, o que significa que a estrela de nêutrons deve estar lá. Para começar, a intensidade dos raios X de alta energia permaneceu quase a mesma entre 2012 e 2014, enquanto a emissão de rádio detectada com o Australia Telescope Compact Array aumentou neste período. Isso contraria as predições feitas pela hipótese da onda de choque. A seguir, os autores estimam que seria necessário um período de cerca de 400 anos para que os elétrons fossem acelerados até o patamar das altas energias observadas nos dados do NuSTAR. Isso representa um período 10 vezes maior do que o tempo decorrido desde que houve a explosão.
“Os astrônomos questionam se o tempo que passou foi insuficiente para que ocorresse a formação de um pulsar, ou se o SN 1987A criou um buraco negro”, disse o co-autor Marco Miceli, também da Universidade de Palermo. “Este é um debate que ocorre há décadas.”
Os dados do Chandra e do NuSTAR também apóiam um resultado obtido em 2020 do ALMA que forneceu possíveis evidências para a estrutura de uma nebulosa de vento de pulsar na faixa milimétrica do comprimento de onda . Embora haja outras explicações possíveis para essa “bolha”, os novos dados de raios x obtidos pelo estudo podem permitir identificá-la como uma nebulosa de vento de pulsar. Esta é mais uma evidência que apóia a ideia de que uma estrela de nêutrons se formou após a explosão. Se realmente esta estrela é um pulsar que existe no centro de SN 1987A, seria o caso do mais jovem pulsar já encontrado.
“Termos a oportunidade de observar um pulsar basicamente desde o seu nascimento seria algo sem precedente”, disse o co-autor Salvatore Orlando, do Observatório Astronômico de Palermo, uma instalação de pesquisa do Instituto Nacional de Astrofísica (INAF) na Itália. “Pode ser a oportunidade muito especial de estudarmos o desenvolvimento de um pulsar desde bebê.”
O centro de SN 1987A é cercado por gás e poeira. Os autores recorreram a simulações de última geração para entender como esse material absorveria os raios X em diferentes energias, o que permitiria uma interpretação mais precisa do espectro de raios X, ou seja, a estimar a quantidade de raios X existente em diferentes níveis de energia. Isso lhes permite estimar como deve ser o espectro de raios X encontrados nas regiões centrais do SN 1987A, que atualmente está escondido sob os detritos.
Porém, mais dados são necessários para que se possa fortalecer a hipótese da nebulosa de vento de pulsar. Registrar em observações futuras um aumento nas ondas de rádio acompanhado por um aumento nos raios X de energia relativamente alta seria um argumento contra essa ideia. Por outro lado, se os astrônomos observarem uma diminuição nos raios X de alta energia, então a presença de uma nebulosa de vento pulsar será corroborada.
Os destroços remanescentes da estrela que explodiu que existem ao redor do pulsar desempenham um papel importante, pois absorvem boa parte dos raios X de baixa energia emitidos, o que os tornaria indetectáveis no momento. O modelo prevê que esse material se dispersará nos próximos anos, o que reduzirá seu poder de absorção. Assim, a emissão do pulsar deverá surgir em cerca de 10 anos, revelando a existência da estrela de nêutrons.
Publicado em 24/02/2021