Arqueólogos encontram casas maias em antigo local de extração de sal
Em novos trabalhos com evidências arqueológicas da salineira maia Ek Way Nal, em Belize, um grupo de pesquisadores identificou diversas construções especializadas em ferver salmoura para obter sal. Foram descobertas também residências dos trabalhadores locais, colocando fim ao mistério de como as salinas operavam.
Os maias foram uma civilização milenar localizada na Mesoamérica — entre a América Central e o sul da América do Norte — conhecida por suas extensas obras arquitetônicas, arte, cultura e sistema de escrita. Mas isso não quer dizer que tivessem acesso fácil ao sal.
Apesar de trivial atualmente, obter essa substância era mais complicado para aqueles que viviam no interior do continente. Isso é especialmente importante ao considerar a necessidade do sal para dieta humana e o bom funcionamento do organismo.
Cientistas acreditam que os maias tinham dois principais pontos de extração, que posteriormente era transportado para suprir as necessidades no interior. O primeiro eram as planícies de sal localizadas no atual estado mexicano de Yucatán, onde ele poderia ser extraído diretamente.
A segunda fonte é a indústria salineira de Ek Way Nal, em Belize. Nesse local, Heather McKillop, arqueóloga maia do Departamento de Geografia e Antropologia da Universidade do Estado da Louisiana (LSU), encontrou cacos de cerâmica e restos de construções utilizadas para extração do sal no sítio arqueológico submerso em água salgada. Pelo que indicam esses registros, os maias utilizavam potes de cerâmica reforçada para ferver salmoura dentro dessas construções, feitas de madeira e palha. Quando a fervura terminava, o sal era coletado e transportado.
Da onde vinham os extratores de sal?
Ainda não se conhecia profundamente as dinâmicas dessa indústria salineira, e nem da onde vinham os trabalhadores que a operavam. Dessa forma, algumas hipóteses especularam que eles eram trazidos diariamente ou sazonalmente para o local, produziam sal em grandes quantidades e depois retornavam ao interior.
Apesar dos trabalhos no sítio arqueológico estarem paralisados desde março de 2020 devido à pandemia, novas descobertas feitas a partir da reanálise de evidências indicam que outra explicação é mais provável. Segundo o estudo, publicado no periódico Ancient Mesoamerica, foram descobertos indícios de dez construções, preservadas em ambiente sem oxigênio em turfa debaixo d’água. O estudo também indicou a presença de outras construções: pelo menos uma delas era utilizada como residência pelos trabalhadores e havia uma “cozinha de sal” com três seções distintas. Portanto, eles não apenas utilizavam o local para extração do sal, mas ele era também sua moradia.
Além disso, os registros indicam que a atividade era mais complexa: algumas áreas serviam para salgar e secar peixes coletados na região para preservá-los, entre outras atividades relacionadas ou não com a produção de sal.
Ciência à distância
Para fazer essas descobertas, foi preciso transportar as evidências até os laboratórios da LCU, antes de realizar novos testes. “O laboratório de arqueologia parecia uma festa de tupperwares, com centenas de contêineres de plástico com água. Mas eles estão mantendo as amostras de madeira preservadas para que elas não sequem e se deteriorem,” explicou McKillop.
Ela explica que decidiu enviar as amostras para datação por radiocarbono para analisar se todas as construções do Ek Way Nal são do mesmo época. Assim, os resultados indicaram que elas foram construídas durante diversos períodos da história maia. As últimas datam do colapso da era Clássica e abandono das cidades.
A análise foi especialmente frutífera devido a comparação com outro sítio arqueológico. “Usando o stítio Sacapulas, Guatemala, já bem estudado, como um modelo funcionou bem para desenvolver expectativas arqueológicas para as diferentes atividades de fervura de salmoura em ‘cozinhas de sal’, uma residência e outras atividades,” afirma McKillop.
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“A pesquisa destaca a importância de datar por radiocarbono cada construção de madeira e palha nas salineiras para avaliar a capacidade de produção dessa substância [em uma determinada época],” explica ela. Mesmo sem ter acesso direto ao local, McKillop explica que conclusões importantes sobre as dinâmicas da produção de sal dos maias ainda puderam ser elaboradas.
“Usar as salineiras de Sacapulas como um modelo […] sugere que maias morando permanentemente nessa comunidade estavam engajados em uma produção que superava as necessidades locais de sal, que deveria ser bem integrado na economia regional. Dessa forma, isso permitiu-os adquirir uma variedade de produtos não-locais“. Estes produtos são a evidência da organização social elevada da civilização maia, e da maneira como seu comércio interno conectava o litoral ao interior, tanto para o comércio de sal como de outras mercadorias.
Publicado em 24/11/2021.