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Água em marte: Descoberta de três lagos subterrâneos intriga cientistas

Pesquisadores dizem ter detectado grupo de lagos escondido por baixo da superfície gelada do Planeta Vermelho

Há dois anos, cientistas  reportaram a descoberta de um grande lago salgado por baixo do gelado pólo sul  de Marte, um achado  que foi recebido com muita empolgação e certo ceticismo. Agora, pesquisadores alegam ter confirmado a presença de tal lago, e descobriram outros três mais. 

A descoberta, relatada em 28 de setembro na Nature Astronomy, foi feita utilizando dados de radar da Agência Espacial Europeia (ESA) que orbita na espaçonave Mars Express. Ela segue a detecção de um único lago subterrâneo na mesma região em 2018 — que, se confirmada, seria o primeiro corpo de água líquida já detectado no planeta vermelho e um possível habitat para a vida. Mas o achado  foi baseado em apenas 29 observações feitas entre 2012 e 2015, e muitos pesquisadores dizem que mais evidências são necessárias para apoiar a suposição. O estudo mais recente utilizada de um conjunto de dados mais amplo que contém 134 observações feitas entre 2012 e 2019. 

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“Nós identificamos o mesmo corpo d’água, mas nós também encontramos três outros corpos d’água ao redor do principal”, diz a cientista planetária Elena Pettinelli da Universidade de Roma, que é uma das co-autoras da pesquisa. “É um sistema complexo.” 

A equipe utilizou um instrumento de radar na Mars Express chamado Mars Advanced Radar for Subsurface and Ionosphere Sounding (MARSIS) para analisar a região do polo sul do planeta. MARSIS envia ondas de rádio que se chocam com as camadas de material na superfície do planeta e por baixo dela. A maneira que o sinal é refletido indica o tipo de material que está presente em uma localização particular — rocha, gelo ou água, por exemplo. Um método similar é utilizado para identificar lagos glaciais subterrâneos na Terra. A equipe detectou algumas áreas de alta refletividade que dizem indicar corpos de água líquida presas abaixo de mais de um quilômetro de gelo marciano. 

Os lagos estão espalhados em cerca de 75000 quilômetros quadrados —  área equivalente a aproximadamente um quinto  da Alemanha. O maior lago mede 30 quilômetros de comprimento, e está cercado por três lagos menores, cada um com alguns quilômetros de comprimento. 

Lagos salgados

Na superfície de Marte, a baixa pressão que resulta da falta de uma atmosfera substancial do planeta impossibilita a presença de água líquida. Mas os cientistas há muito tempo acreditam que poderia haver água presa sob a superfície, talvez um remanescente de quando o planeta possuía mares e lagos, bilhões de anos atrás. Se tais reservas existem, elas poderiam potencialmente abrigar  vida em Marte. Na Terra, a vida consegue sobreviver em lagos subglaciais em locais como a Antártica. 

Mas a quantidade de sal presente poderia impor problemas. Se supõe  que qualquer lago subterrâneo em Marte deve ter uma quantidade razoável de sal para que a água permaneça líquida. Apesar de o subterrâneo ter uma pequena quantidade de calor do interior de Marte, não seria o suficiente para derreter o gelo em água. “Do ponto de vista térmico, tem que ser salgado”, diz Pettinelli. 

Lagos com uma água cinco vezes mais salgada do que a água do mar podem suportar vida, mas se essa quantidade chegar a 20  vezes, a vida não está mais presente, diz John Priscu, cientista ambiental na Universidade do Estado de Montana. 

“Não existe muita vida ativa nessas piscinas salgadas na Antártica”, diz Priscu, cujo grupo estuda microbiologia em ambientes glaciais. “Elas ficam em conserva. E esse pode ser o caso [em Marte]”. 

Debate aquecido

A existência  de lagos marcianos por si só ainda é debatida. Após a descoberta de 2018, os pesquisadores levantaram problemas possíveis. E apesar de as últimas descobertas apoiarem a observação de 2018, e envolver muitos outros dados, nem todos estão convencidos de que as regiões identificadas possuem água líquida. 

“Se o material claro for realmente água líquida, acredito que ela provavelmente representa um tipo de lama ou lodo”, diz Mike Sori, geofísico planetário da Universidade de Purdue, em West Lafayette, Indiana. 

Jack Holt, cientista planetário na Universidade de Arizona, diz que enquanto acredita que os últimos dados são bons, não tem certeza sobre a interpretação. “Eu não acredito que sejam lagos”, diz Holt, que está na equipe científica do MArs Shallow Radar (SHARAD) no Orbitador de Reconhecimento de Marte da NASA (MRO). “Não há calor o suficiente para existir uma salmoura aqui, mesmo por baixo da camada de gelo”. 

Uma missão chinesa que está a caminho de Marte pode oferecer uma maneira de checar as suposições. A missão Tianwen-1 entrará em órbita em fevereiro de 2021, e além de lançar um rover na superfície, o orbitador carregará uma série de instrumentos científicos. Entre eles, um equipamento de radar que poderia ser utilizado para realizar observações similares. “Suas capacidades são similares a MARSIS e SHARAD”, diz David Flannery, da Universidade de Queensland de Tecnologia.

Até o momento, a perspectiva de que esses lagos são remanescentes do passado molhado de Marte ainda é uma possibilidade interessante. “Pode ter tido muita água em Marte”, diz Pettinelli. “E se houve água, existe a possibilidade de vida”.  

Jonathan O’Callaghan

Nature Magazine

Publicado em 30/09/2020

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